A ciência revela que pais mentem mais para os filhos do que imaginam. E vice-versa. Conheça as maiores inverdades que fizeram a sua cabeça.
"Fazemos tudo por você"
"Estou sem dinheiro"
"Eu amo meus filhos da mesma forma"
"Mentir é feio"
"Não vai doer nada"
A primeira pedra
"Não. Até onde eu saiba, não há pais que criem seus filhos sem mentir. E raro é o casal que não mente diariamente um ao outro como malditos jornalistas", respondeu-me Brad Blanton, autor de Radical Honesty (Honestidade Radical, sem versão brasileira). Apesar de eu gostar do tom sádico do psicólogo, fiquei frustrado. Para esta edição especial sobre mentiras em família, eu queria um contraponto. Até que recebi um e-mail de Dorota Owen. A professora britânica atirou a primeira pedra.
Quando seus 3 filhos eram pequenos, Dorota lhes dizia: "Se você contar o que fizer, não vai arranjar encrenca". Então, quando quebravam um vaso, saíam correndo até a mãe para ver quem contava em primeiro lugar. Ao receber um presente de Natal de que não gostou, a caçula simplesmente o arremessou para longe. E, aos 8 anos, a filha mais velha olhou para os pais discutindo à mesa enquanto esperavam o jantar ser servido e disse: "Não sei por que vocês dois continuam juntos se obviamente não são felizes". O casal se entreolhou, depois, olhou para a criança e Dorota terminou o casamento. "Ela está certa. Essa brincadeira acabou." Mais tarde, quando os filhos perguntaram sobre sua juventude, Dorota não mediu palavras. "Disse que misturava minhas bebidas e que fiquei bêbada aos 15. Levei a faculdade nas coxas porque usava drogas e acabei expulsa. Mas ainda assim consegui um diploma, ainda que depois de mudar de arquitetura para artes plásticas e literatura." A filha então disse que a admirava pela sinceridade.
A honestidade radical pode funcionar com os Owens. Mas ela é uma exceção. A regra é usar a mentira como ferramenta de criação. Quando não conseguem impor sua autoridade, pais passam o bastão para figuras imaginárias, de um Papai Noel chantagista a policiais que prendem crianças. Escondem o que fizeram na juventude, fogem de assuntos difíceis, ensinam que os filhos precisam mentir em nome da polidez - e ainda assim falam que mentir é feio. Filhos não são diferentes. Ainda no útero, seu sistema endócrino já começa a enganar o corpo da mãe. Basta nascer para aprender a manipular com choro falso. E, conforme percebem que vasos quebrados significam problema, vão treinando a mentira até atingirem a perfeição na adolescência. Falha moral? Não, apenas natureza humana. A mentira foi essencial para o desenvolvimento da inteligência social e continua a permear nossas relações - até mesmo entre pais e filhos. É isso o que mostraremos para você, leitor, nesta edição especial.
Boa leitura.
Maurício Horta - editor.
1. "Eu amo meus filhos da mesma forma."
A verdade: Na hora de escolher a quem dar mais atenção, a mãe vai preferir a criança mais nova. Já numa situação de vida ou morte, ela tende a escolher a mais velha.
Pais não abandonam seus filhos na roda dos enjeitados por mais que eles chorem, façam sujeira e exijam atenção o tempo todo. O motivo é simples: os genes dos pais querem ser levados adiante. E, como as crianças adquirem habilidades e conhecimentos suficientes para se manterem por conta própria somente lá pelos 7 anos, teve mais vantagem evolutiva quem se predispôs a cuidar melhor de seus filhos. Afinal, quem não foi predisposto ao cuidado provavelmente viu seus filhos morrerem - e, assim, não levaram adiante um eventual "gene da negligência". Só que daí surge mais um problema. Antes de o primeiro filho ficar menos dependente da mãe, ela pode ter tido vários outros filhos. E mais. A proteção e os recursos que ela pode oferecer a esses filhos são limitados. Como distribuir isso? Depende da situação. No dia a dia, ela favorece o caçula. Afinal, um bebê provavelmente morreria sem alimentos e proteção, enquanto uma criança mais velha teria mais chances de se virar sozinha ou de procurar ajuda de outros. "Eis a razão de os mamíferos desmamarem suas crias, em vez de alimentá-las indefinidamente", afirma o evolucionista britânico Richard Dawkins no clássico O Gene Egoísta. "Chega um momento na vida de um filho em que passa a ser compensador para a mãe dirigir esse investimento para os futuros filhos." Agora, numa situação de vida ou morte em que a mãe precisa escolher qual de seus filhos sobreviverá, a teoria da evolução prevê que ela escolherá o mais velho. "Se a mãe salvar o filho mais novo, terá ainda de investir nele alguns recursos valiosos para que ele possa vir a alcançar a idade do irmão mais velho." POR MAURÍCIO HORTA
"Se o mais velho morrer, a mãe arrisca perder uma proporção maior do investimento parental do que se morrer o irmão mais novo." Richard Dawkins
Fonte: Revista Super Interessante ed. especial: Mentiras.- "As mentiras que os pais contam para os filhos e as que os filhos contam para os pais" N⁰ 312, DEZEMBRO 2012, PÁGs: 1, 2, 3, 4, 5, 6, 7 e 8.
Quando seus 3 filhos eram pequenos, Dorota lhes dizia: "Se você contar o que fizer, não vai arranjar encrenca". Então, quando quebravam um vaso, saíam correndo até a mãe para ver quem contava em primeiro lugar. Ao receber um presente de Natal de que não gostou, a caçula simplesmente o arremessou para longe. E, aos 8 anos, a filha mais velha olhou para os pais discutindo à mesa enquanto esperavam o jantar ser servido e disse: "Não sei por que vocês dois continuam juntos se obviamente não são felizes". O casal se entreolhou, depois, olhou para a criança e Dorota terminou o casamento. "Ela está certa. Essa brincadeira acabou." Mais tarde, quando os filhos perguntaram sobre sua juventude, Dorota não mediu palavras. "Disse que misturava minhas bebidas e que fiquei bêbada aos 15. Levei a faculdade nas coxas porque usava drogas e acabei expulsa. Mas ainda assim consegui um diploma, ainda que depois de mudar de arquitetura para artes plásticas e literatura." A filha então disse que a admirava pela sinceridade.
A honestidade radical pode funcionar com os Owens. Mas ela é uma exceção. A regra é usar a mentira como ferramenta de criação. Quando não conseguem impor sua autoridade, pais passam o bastão para figuras imaginárias, de um Papai Noel chantagista a policiais que prendem crianças. Escondem o que fizeram na juventude, fogem de assuntos difíceis, ensinam que os filhos precisam mentir em nome da polidez - e ainda assim falam que mentir é feio. Filhos não são diferentes. Ainda no útero, seu sistema endócrino já começa a enganar o corpo da mãe. Basta nascer para aprender a manipular com choro falso. E, conforme percebem que vasos quebrados significam problema, vão treinando a mentira até atingirem a perfeição na adolescência. Falha moral? Não, apenas natureza humana. A mentira foi essencial para o desenvolvimento da inteligência social e continua a permear nossas relações - até mesmo entre pais e filhos. É isso o que mostraremos para você, leitor, nesta edição especial.
Boa leitura.
Maurício Horta - editor.
1. "Eu amo meus filhos da mesma forma."
A verdade: Na hora de escolher a quem dar mais atenção, a mãe vai preferir a criança mais nova. Já numa situação de vida ou morte, ela tende a escolher a mais velha.
Pais não abandonam seus filhos na roda dos enjeitados por mais que eles chorem, façam sujeira e exijam atenção o tempo todo. O motivo é simples: os genes dos pais querem ser levados adiante. E, como as crianças adquirem habilidades e conhecimentos suficientes para se manterem por conta própria somente lá pelos 7 anos, teve mais vantagem evolutiva quem se predispôs a cuidar melhor de seus filhos. Afinal, quem não foi predisposto ao cuidado provavelmente viu seus filhos morrerem - e, assim, não levaram adiante um eventual "gene da negligência". Só que daí surge mais um problema. Antes de o primeiro filho ficar menos dependente da mãe, ela pode ter tido vários outros filhos. E mais. A proteção e os recursos que ela pode oferecer a esses filhos são limitados. Como distribuir isso? Depende da situação. No dia a dia, ela favorece o caçula. Afinal, um bebê provavelmente morreria sem alimentos e proteção, enquanto uma criança mais velha teria mais chances de se virar sozinha ou de procurar ajuda de outros. "Eis a razão de os mamíferos desmamarem suas crias, em vez de alimentá-las indefinidamente", afirma o evolucionista britânico Richard Dawkins no clássico O Gene Egoísta. "Chega um momento na vida de um filho em que passa a ser compensador para a mãe dirigir esse investimento para os futuros filhos." Agora, numa situação de vida ou morte em que a mãe precisa escolher qual de seus filhos sobreviverá, a teoria da evolução prevê que ela escolherá o mais velho. "Se a mãe salvar o filho mais novo, terá ainda de investir nele alguns recursos valiosos para que ele possa vir a alcançar a idade do irmão mais velho." POR MAURÍCIO HORTA
"Se o mais velho morrer, a mãe arrisca perder uma proporção maior do investimento parental do que se morrer o irmão mais novo." Richard Dawkins
Fonte: Revista Super Interessante ed. especial: Mentiras.- "As mentiras que os pais contam para os filhos e as que os filhos contam para os pais" N⁰ 312, DEZEMBRO 2012, PÁGs: 1, 2, 3, 4, 5, 6, 7 e 8.
NA PRÓXIMA POSTAGEM VOCÊ VAI DESCOBRIR A VERDADE DA MENTIRA: "VOCÊ DEVE AMAR SEU IRMÃOZINHO".